Sting no EDP Cool Jazz...
10 mil pessoas (números da organização) enchem Estádio de Oeiras para ver um Sting em forma. Saiba mais sobre o espetáculo, que durou cerca de duas horas e trouxe 20 canções aos portugueses.
Com vários concertos distribuídos por dias e espaços diferentes, e geralmente destinados a um público adulto, o EDP Cool Jazz não é o mais típico dos festivais de verão. Mas no acolhedor Estádio de Oeiras, ao fim da tarde de um final de semana, já se sente no ar um certo espírito estival: há crianças a correr com gelados, várias famílias em convívio e um ambiente amistoso no relvado protegido por tapete. Às 21h, a programação do festival arranca, oficialmente, com a primeira parte do concerto de Sting, a cargo de James Walsh. Em tempos líder dos britânicos Starsailor, o cantor enfrenta agora as plateias que aguardam a chegada de Sting munido apenas de guitarra acústica, bateria e um piano elétrico. As canções, ora do seu disco a solo ora dos desativados Starsailor (em pousio desde 2009), variam pouco entre si - 'Tell Me It's Not Over', 'Precious Stolen Moments' e 'Lullaby' foram algumas das eleitas para o passeio até Oeiras - mas a prestação de Walsh não é destituída de coragem e arranca alguns aplausos a uma plateia onde vislumbrámos alguns ilustres, como Herman José.
Muitos aproveitam, também, a primeira parte para jantar: nesta primeira noite do EDP Cool Jazz, cachorros quentes e pizza eram as opções do menu, se comprado dentro do estádio. E, apesar de a ficha da banda da wikipédia afiançar que os Starsailor venderam três milhões de discos, James Walsh apresenta o êxito da banda, 'Four To The Floor', com um pouco confiante "se conhecerem alguma canção é esta".
"Eu nem nunca tinha ouvido falar deste estádio", ouvimos alguém comentar no intervalo entre os concertos de James Walsh e Sting. Não seria o único a viver no desconhecimento, dizemos nós, e a verdade é que o Estádio de Oeiras provou ser uma boa opção para concertos desta dimensão, unindo duas virtudes: a capacidade de albergar muita gente e um certo intimismo, ou caráter familiar, de estádios que estão (muito) longe de ser gigantescos. "Quem é que trouxe as cartas?", ouvimos ainda um espectador perguntar aos amigos, antes de se sentar no chão, enquanto, ao seu lado, um fã de Sting cumprimentava outro com a constatação: "Agora só nos vemos no rock!".
À hora prevista, e poucos segundos depois de os restantes músicos tomarem os seus lugares, Sting sobe a palco, para gáudio da multidão que, pelas 22h, já enche o estádio (a organização fala em 10 mil bilhetes vendidos). No campeonato das estrelas rock bem parecidas para a idade, o nosso anfitrião desta noite, bronzeado e sorridente, estará com certeza na frente do pelotão. Aos 60 anos, o inglês a bordo da digressão Back To Bass - afinal, o instrumento que o celebrizou - não parece só bem, também soa. À primeira canção, 'All This Time', com boa parte do público entretido a registar o momento com o telemóvel, a voz elástica de Gordon Sumner dança nos nossos ouvidos com a vivacidade de outros tempos. E, por falar de outros tempos, foi impossível não pensar na influência que o antigo líder dos Police terá tido no moldar das cordas vocais de Adam Levine, dos Maroon 5, ou mesmo Ezra Koenig, dos Vampire Weekend, a quem por regra se atribui o "padrinho" Paul Simon.
"Muito obrigado, boa noite - sou Sting", agradeceu, ao final da primeira música e em Português, o protagonista do serão. "Estou muito feliz de estar aqui com vocês". O breve discurso deu origem à primeira de muitas ovações da noite: canções como 'Every Little Thing She Does Is Magic', uma das mais contagiantes do repertório dos Police, e a popularíssima 'Englishman in New York', apresentadas logo de seguida, geraram coros excitados (no caso de "Englishman...", os dotes canoros dos populares fizeram mesmo ouvir-se antes dos de Sting), repetindo-se a euforia nos temas que mais falam ao coração dos presentes: a sequência 'Fields of Gold' / 'Message in a Bottle' foi um desses momentos, provando também a amplitude vocal de Sting, capaz de passar do sussurro - do qual fez uso, ainda, na celebradíssima 'Shape of My Heart' - aos uivos que, em noite de lua semi-encoberta, tão bem serviram as acrobacias melódicas de 'Seven Days' ou 'King of Pain' (e, nesta canção em particular, demos por nós a pensar como é óbvia a filiação de Gotye no êxito 'Somebody That I Used To Know', que curiosamente passou no estádio antes do concerto).
Antes do espetáculo começar, Sting pediu - por interposta pessoa, claro está - aos fotógrafos presentes, incluindo a repórter fotográfica da BLITZ, que assinassem um contrato no qual se comprometiam a respeitar certas condições. Uma delas era não fotografá-lo apenas a si, mas também aos "músicos da banda e/ou orquestra". O apelo faz sentido quando, ao longo das duas horas de concerto, nos apercebemos da liberdade que Sting dá aos seus músicos, amplamente elogiados. Sem demérito para qualquer um dos demais (Dominic Miller na guitarra - inclusive na portuguesa; David Sancious, ex-E Street Band, nas teclas; Vinnie Colauita na bateria e Jo Lawry nos coros), é o violinista Peter Tickell quem acaba por surpreender "encher a vista", protagonizando verdadeiros solos e "duelos" com outros instrumentos, entusiasmando a plateia na frente do palco e trazendo novidade a canções como 'Seven Days', apresentada numa versão sincopada, ou 'Driven To Tears', mais jazzy.
Nem sempre a atenção do público se manteve, contudo, mas Sting foi sempre suficientemente astuto para, com um simples gesto, convidar/convencer a multidão a acompanhá-lo com palmas e coros acertados. Em 'I Hung My Head', que Johnny Cash chegou a revisitar na saga American Recordings , a intensidade da reta final quase pedia um coro gospel, ou pelo menos soul - mas, ao contrário do que aconteceu na digressão pelos Estados Unidos, o artista não fez referência à versão do Man in Black para o tema de 'Mercury Faling' (1996). Também 'Love Is Stronger Than Justice', de 'Ten Summoner's Tales' (1993), exala um ligeiro balanço country ao qual os pagantes se mostraram menos sensíveis.
Para os encores-relâmpago (os músicos ausentavam-se de palco durante meros segundos), Sting e a banda guardaram vários tiros certeiros: 'King of Pain', 'Every Breath You Take' e 'Roxanne' eram praticamente incontornáveis, mas destaquemos "Desert Rose", uma boa prova da relativa renovação que algumas destas canções sofreram. Sobretudo mercê do trabalho de Peter Tickell no violino, 'Desert Rose', cantado originalmente em dueto com o argelino Cheb Mami, não perdeu a aura africana mas ganhou, também, uns toques de festa cigana que fizeram do tema de 1999 um dos grandes momentos do concerto de Sting na abertura do EDP Cool Jazz 2012.
(c) Blitz by Lia Pereira